terça-feira, 30 de novembro de 2010

ESSIENI, O DIÁRIO DE VIAGEM

ESSIENI

A partir da próxima semana, estaremos publicando semanalmente, um capítulo do Diário de Viagem realizado pela europa em 2000, portanto há dez anos, para que vocês possam se deleitar, não apenas nos lugares que passamos, nas emoções que sentimos, nas sensações que tivemos, mas, principalmente na estética da escrita, na forma do mosaico que foi montado, através de desenhos, imagens, contornos e musicalidade. Será postado no ARGUMENTANDI FILUM. Confira!!!

O CANIBALISMO PLANETÁRIO

HOLOCAUSTO CANIBAL-2


A economia é o motor propulsor das relações entre as pessoas, entre as cidades, entre os países, entre o mundo, foi por meio da troca e da venda que os ordenamentos e os ajustes das ações humanas foram se pautando. Na idade primigênia quem possuia e dominava o fogo, detinha maior poder estratégico de comando e jugo. Não é a tôa que os fâmulos pediam proteção ao pater familia para se livrarem do jugo dos bestiones que, para saciarem a fome, antropofagicamente consumiam a crua carne dos andarilhos errantes pela tenebrosa selva e, entre estes, já se guerreavam em busca de comida e de fogo. Assim agregou-se valores às coisas, a comida tornou-se imprescindível e o fogo necessaríssimo. Essa dinâmica prevalece até aos nossos dias. Em busca de proteção, a barbárie regressada se manifesta na emergência das medidas, dos acordos escusos e das defesas umbilicais num olhar ciclópico e restrito, o restante que se lixe. Como se, este restante não fizesse parte da parte maior; como se, o todo fosse infenso as suas partes e, a lesão em uma delas não afetasse a relação entre as partes e o todo.
Este é o grande desafio, dar ordenação e uniformização em meio às turbulências para que o todo possa se encaixar, ou melhor, se readaptar às ações entre as suas partes. Desafio que somente o olhar providentino é capaz de suplantar todos os entraves regressados na busca incessante do bem comum.
Mas, infelizmente, o barbarismo se conduz pelo subterrâneo da densa treva, como podemos observar agora com o escândalo do vazamento de documentos de espionagem do Departamento de Estado norte-americano no site do WikLeaks, que motivou a criação da sala de guerra para tratar desse assunto durante 24h, a mando da secretária de estado Hillary Clinton. Conjuguemos estes dois fatores que formam o estôfo necessário e útil da barbárie regressada pelo ânimo dos atores que atingirão sobremaneira o corpo dos expectadores. A delação, o embuste e a artimanha são decodificadas, registradas e arquivadas para a montagem de políticas estratégicas que desencadeiam e fomentam a belicosidade planetária, o canibalismo econômico. Salve-se quem puder, a vida.



Reprise de um filme triste


ABRAM SZAJMAN



A guerra cambial, portanto, está deflagrada: a queda de braço entre EUA e China é batalha que provoca estragos, e não só entre os contendores




A moeda é nossa, o problema é de vocês. A frase, que sintetiza o desafio lançado ao mundo na década de 1970, quando os Estados Unidos romperam o lastro em ouro que até então garantia o dólar, recupera atualidade porque, à semelhança dos remakes de filmes antigos, o governo norte-americano tenta reprisar o roteiro de saída da crise adotado no passado.
As semelhanças entre o momento que vivemos e as crises cambiais e do petróleo daqueles anos reside no mesmo artifício usado, então e agora, pelo país detentor da moeda de uso comum -única aceita por todos os demais- para superar suas dificuldades à custa de outros.
Esta ópera tem dois atos, e a trama adquire o sinistro aspecto de armadilha: na primeira parte, os EUA afrouxam a política fiscal, inundam o mundo com dólares e, assim, desvalorizam sua moeda em relação às demais, elevando artificialmente, com juros muito baixos, a produtividade de sua economia.
No segundo ato, quando se fazem sentir os efeitos inflacionários dessa política expansionista, elevam a taxa de juros interna, como fez em 1979 o então presidente do Federal Reserve (Banco Central dos EUA) Paul Volker, fechando o alçapão para quebrar países endividados, como ocorreu naqueles anos. As comportas para o dólar barato alavancar as exportações dos EUA já estão abertas.
Algumas décadas de distância, um Muro de Berlim a menos e uma China pujante a mais, porém, fazem do panorama atual uma realidade bem diferente daquela que antecedeu o fim da Guerra Fria.
Num mundo economicamente mais amplo e efetivamente globalizado, os países emergentes de hoje resistem a repetir a postura passada do Japão, que consentiu na valorização de sua moeda e pagou o preço de uma forte e prolongada estagnação.
A guerra cambial, portanto, está deflagrada. A queda de braço entre Estados Unidos e China é batalha que provoca estragos, e não só entre os principais contendores.
Ela obriga países como o Brasil a tomar medidas custosas a fim de se defender da volatilidade global.
Muitos tentarão se proteger por meio de taxação, controle de capitais, regimes de regulação e intervenções diretas.
O resultado pode ser um mercado financeiro global fragmentado e uma consequente onda de protecionismo que tende a transformar todos os participantes do jogo em perdedores.
A esperança para alterarmos o final desse filme triste, que no passado desembocou na Grande Depressão e na Segunda Guerra Mundial, concentra-se na mudança de atitudes e de paradigmas.
É necessário romper com o padrão de acumulação a qualquer custo herdado das revoluções mercantil e industrial, que levou à destruição ambiental e à exclusão social de bilhões de pessoas, substituindo-o por um modelo cooperativo, planejado em organismos multilaterais como o G20.
Um único país, ainda que seja o mais poderoso, não pode manter a exclusividade do lucro, enquanto no auge de uma crise gerada em suas próprias entranhas emprega a força para socializar os prejuízos.
É da natureza do escorpião matar o sapo que o transporta para a margem do rio, mas tem de deixar de ser da natureza do capitalismo o egoísmo e a ganância desenfreada, que podem novamente conduzir os países à desagregação e o mundo inteiro à barbárie. FSP-30/11/10



ABRAM SZAJMAN, empresário, é presidente da Fecomercio (Federação do Comércio do Estado de São Paulo), dos conselhos regionais do Sesc (Serviço Social do Comércio), do Senac (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial) e do Sebrae-SP (Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas).