quarta-feira, 13 de julho de 2011

WOOD ALLEN, O ENGENHOSO

MEIA NOITE EM PARIS

Estupefato, esta sensação me trouxe o reconhecimento a Wood Allen no seu novíssimo filme "
Meia noite em Paris". Belíssimo, muito bem acabado, filmografia requintada em tons pastéis e luz de ambar soletrando as pontes milenares molhadas pela chuva. Cena imperdível, como imperdível o retorno ao tempo, uma catarse fantástica que atiça o engenho e compõe-se em metáforas históricas que o passado regressado comporta.
Wood Allen, revela-se certamente um cineasta, superando a fase discursiva-psicanalítica dos diálogos chatos intermináveis. Supera-se ao fazer para criar mediante a Imaginação fantástica e a paixão intensa. "Meia noite em Paris" revela o ato criador, para além da razão, descambando por inteiro na robusta paixão da Imaginação, retirando de forma difuza, numa ida e vinda constante, espiralarmente intensa, porque integrante de um passado que retorna ao presente e se projeta no futuro. O sonho confunde-se com a realidade e dispensa a objetividade num profundo mergulho inteiramente transosmótico. O escritor, sua escrita, os personagens que assumem os sentimentos, as atitudes e a reviravolta de valores condensados, agora estilhaçados por sombras, matizes e perplexidades, num só feixe que se espalha entre a realidade, o sonho e a vida, num movimento espiralantemente concentrado numa difuzão, cuja vivacidade entranha-se na emoção e no sentimento do personagem.
A contextualização do texto funde-se com a vida e soletra nos sentimentos as emoções de amor, relação e delírio que o escritor enquanto autor vive intensamente entre a escrita e a vida. Revisita Henminguey, Emmile Zola, Salvador Dalli, Faukner, Buñuel e tantos outros personagens que o fazem reinventar-se no enredo e expor na simetria das letras a pulsão constante de sua criatura nas entranhas mesma de seu criador. A vida confunde-se com a arte, a arte faz da vida a superação, os desencontros e os reeencontros entre remotos tempos que se dilaceram e se iluminam entre a clareza sensível da mente original e a criação fantástica. Wood Allen soube muito bem apreender esta superação. Não mais o protagonista dos rosários intermináveis e cansativos, mas o cineasta perfeito e completo que soube genialmente fazer do imaginário a matéria substancial da criação e de lado, deixou as ordenações discursivas e artificiais que adessam, mas não condensam, que profusam, mas não revelam, que intelectualizam, mas não originalizam.
Realidade e fantasia se encontram extraordinariamente, ou como diria meu saudoso mestre Benedito Nunes: "a realidade é tão fantástica, quanto a fantasia é real".