domingo, 13 de fevereiro de 2011

OS BATALHADORES

 Infelizmente a entrevista inicia mal posta, quando compara a nova classe "média" com a classe média tradicional. Nessa regra já se pressupõe um juízo de valor de verdade, o que por si só já distorce a análise do fenômeno social.
Por que a nova classe média emergente deveria conter as mesmas caracteristicas da tradicional, para que fosse considerada CM? A não ser que se parta do princípio de que, para se ter conhecimento é necessário que uniformizemos os parâmetros de mensuração, ou teremos uma grande confusão. Aqui reside a confusão, no rigor da uniformização, a fim de que nos dê um justo resultado. Segundo, a categoria "batalhadores" é genérica e rançosa, pois revela um grau de discriminação à CM tradicional. Uma empáfia teórica desnecessária que nada esclarece e tudo obscurece. Temos, sim, uma nova CM emergente que possui suas características peculiares e seu contexto cultural e histórico delimitado. Está em franca expansão na busca de sua consolidação que independe de sua ação isolada, mas depende de todos os fatores sociais e econômicos convergentes com todas as condições postas historicamente, isto é, mediante sua ação e necessariamente seu conhecimento. Isso posto, a consolidação vai se processando no seu tempo e amalgamando-se inter e entre-classes, gerando assim sua maturação. Portanto, categorizar e classificar é mais uma quantificação positivista que sua apreensão histórico-natural. O olhar necessita de vários enfoques e angulosidades num referencial incerto para conferir a certeza do que se assemelha à verdade, mas com ela não se confunde.
 
Em seu livro, o senhor questiona a afirmação de que o governo Lula alçou 30 milhões de brasileiros à classe média e diz até que se trata de uma mentira. Por quê?
Eu não nego que houve uma efetiva ascensão social de 30 milhões de brasileiros nem que esse fato seja extremamente importante e digno de alegria. O que questiono é a leitura dessa classe como uma classe média.
A classe média é uma das classes dominantes em sociedades modernas como a brasileira porque é constituída pelo acesso privilegiado a um recurso escasso de extrema importância: o capital cultural nas suas mais diversas formas.
Seja sob a forma de capital cultural técnico, como na "tropa de choque" do capital (advogados, engenheiros, administradores, economistas etc.), seja pelo capital cultural literário dos professores, jornalistas, publicitários etc., esse tipo de conhecimento é fundamental para a reprodução e legitimação tanto do mercado quanto do Estado.
Consequentemente, tanto a remuneração quanto o prestígio social atrelados a esse tipo de trabalho --e da condução de vida que ele proporciona-- são consideráveis.
A vida dos "batalhadores" é completamente outra. Ela é marcada pela ausência dos privilégios de nascimento que caracterizam as classes médias e altas.
E, quando se fala de "privilégios de nascimento", não se está falando apenas do dinheiro transmitido por herança de sangue nas classes altas. Esses privilégios envolvem também o recurso mais valioso das classes médias, que é o tempo.
Afinal, é necessário muito tempo livre para incorporar qualquer forma de conhecimento técnico, científico ou filosófico-literário valioso.
Os batalhadores, em sua esmagadora maioria, precisam começar a trabalhar cedo e estudam em escolas públicas muitas vezes de baixa qualidade.
Como lhes faltam tanto o capital cultural altamente valorizado das classes médias quanto o capital econômico das classes altas, eles compensam essa falta com extraordinário esforço pessoal, dupla jornada de trabalho e aceitação de todo tipo de superexploração da mão de obra.
Essa é uma condução de vida típica das classes trabalhadoras, daí nossa hipótese de trabalho desenvolvida no livro que nega e critica o conceito de "nova classe média". FSP/13-02-11

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